O mercado da inovação e o poder do cliente - 03/03/2017


O mercado da inovação e o poder do cliente*


            Produtos, sistemas produtivos e plataformas de troca comercial. Estes três elementos sempre foram centrais na vida socioeconômica e mudanças radicais em uma destas esferas invariavelmente provocaram revoluções nas outras. Mas, e no atual contexto de extrema aceleração nos fluxos de criação, produção e trocas de informação, em que identificar onde a mudança acontece torna-se humanamente impossível – pelo menos a olho nú -, como entender e adaptar-se aos desafios da competição econômica? Compreender o empoderamento dos usuários do sistema provocado pelo acesso à informação torna-se um fator vital, e a interação com este quarto elemento sempre separa quem emergirá ou manter-se-á respirando e quem não vai sobreviver no atual mercado, como muito claramente sustenta Geraldo Dezena, atual vice-presidente de Tecnologia do Banco do Brasil e que muito tem clareado os caminhos para a formação de nosso Centro Regional de Inovação Tecnológica.
            Geraldo, que depois de 40 anos de Banco do Brasil irá se aposentar neste mês de março, permanecendo apenas como conselheiro na instituição, traçou uma contextualização preciosa de como o acesso à informação transformou toda a economia atual, e como esta metamorfose incide sobre sistemas produtivos. Quatro aspectos hoje são fundamentais para se entender as mudanças: a força com que as novas plataformas de comunicação incluem os mais variados atores sociais; tal ampliação da acessibilidade democratiza o acesso à informação; e com isso, não é mais possível setorizar diferentes formas de inovação (no produto, nos sistemas produtivos e comércio), o mercado se transforma em uma vasta rede composta por todos os atores  (do cientista ao consumidor); que a cada momento incidem sobre todo o conhecimento compartilhado em todos os bancos de dados disponíveis a todos – principalmente pela internet -, formando uma grande nuvem de informação. O sucesso para manipular essa “nuvem” estaria em dois desafios: formar atores empreendedores e promover uma transformação na cultura organizacional das empresas tradicionais.
            Muito além de liderar ou motivar grupos, o chamado empreendedorismo consiste na capacidade de organizar projetos inovadores e saber onde e como conseguir as informações certas para fazer com que várias pessoas consigam operar em conjunto o mais eficiente e hábil possível. Isso serve tanto para microempresários criadores de soluções impactantes quanto para funcionários de “chão de fábrica” que são levados a criar aprimoramentos em tecnologia já existentes: o fato é que quem produz não está conectado apenas aos seus colegas horizontalmente ou aos seus superiores, produzem interagindo com clientes informados e capazes de também inovar enquanto consomem.
            Tanto estas microempresas (startups) não conseguem interagir com empresas tradicionais gigantes e fechadas quanto estes funcionários empreendedores ficam algemados em estruturas organizacionais verticalizadas, onde só é permitido interagir com seus superiores. Este cenário decreta o apocalipse para as empresas tradicionais, que, ao invés de se submeterem a estes novos atores, são vencidas pela reorganização destes. Quem não adquirir a flexibilidade exigida pelo novo contexto será sepultado. E este é o grande desafio de qualquer parque industrial, sobretudo os de municípios do interior, quando muitas vezes a distância dos ambientes cosmopolitas faz com que não se perceba as mudanças organizacionais urgentes.
            Assim como em outros textos aqui publicados que tentam resumir conversas fantásticas com outros agentes de inovação locais, nos quais conversas de mais de hora precisam ser sintetizadas em poucos parágrafos, este artigo é apenas um recorte da riquíssima entrevista feita com Geraldo Dezena. Em suma, o desafio apontado por esta personalidade de nível nacional nesta área é a necessidade de adaptação das empresas ao novo contexto de mercado, assumindo o foco em interagircom o cliente, não apenas com sua vontade, mas com os dados que este adquiriu na “nuvem” de informações, inclusive, o fazendo compreender informações codificadas em linguagem científica, o que inclui a ponte com a pesquisa universitária. Esta adaptação organizacional é urgente, e será capaz de incluir muito mais capacidades do que o antigo processo produtivo conseguia, trazendo mudanças sociais bem profundas, duradouras e gratificantes.

* Publicado originalmente no site do jornal O Município em 03/03/2017